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O QUE É O TAO? E SOBRE ESTUDAR OS FENÓMENOS

O Tao Te Ching (o principal texto do taoismo), no capítulo 1, afirma que o seu conceito não é passível de ser definido ou poderá ser descritível em termos compreensíveis à natureza humana:


“O caminho (tao) que pode ser expresso não é o Caminho (tao) constante

O nome que pode ser enunciado não é o Nome constante

Sem-Nome é o princípio do céu e da terra

Com-Nome é a mãe de dez mil coisas”

(tradução pelo Mestre Wu Jyh Cherng)


Todavia, por uma questão de ser possível refletir sobre este tema, poder-se-á considerar que o tao é “o princípio subjacente da existência” ou, por outras palavras, “o caminho do universo”. Como Stout (s/d) refere: “(…) embora não possamos definir o tao intelectualmente, podemos experienciá-lo intuitivamente”.


Diz-nos o autor que, o tao, pode ser estudado. Não se tratando de um processo autoconsciente, que esteja sujeito a técnicas e a propósitos, a aprendizagem sobre o tao ocorre quando relaxamos na sequência dos eventos que ocorrem na nossa vida e, nessa sequência, nos é possível tornar mais conscientes da nossa posição nesses eventos.


Tal afirmação, em verdade, gera um paradoxo, uma vez que pelo facto de nos distanciarmos das situações, tornamo-nos cada vez menos conscientes de nós próprios como sendo separados dos eventos. Assim, o caminho e a nossa descoberta dentro do tao, faculta-nos uma orientação interior, regida por uma constante mutação que nos permite situar, de forma mais objetiva, na visão global da vida.


Neste contexto, até à autonomização do caminhar de cada um, geralmente, estamos sujeitos a um processo de aprendizagem que se gere por metáforas, cuja raiz assenta nas obras e pensamentos dos mestres do passado que já trilharam esse caminho. Assim podemos consagrar três veículos para compreensão dos fenómenos:


1) A verdade interior.

Analisando o capítulo 38 do Tao Te Ching, na tradução do Mestre Wu Jyh Cherng, teremos:

“A Virtude Superior não é virtude Assim, possui a Virtude A Virtude Inferior não perde a virtude Assim, não possui a Virtude

A Virtude Superior é não-ação Pois não utiliza ação A Virtude Inferior é ação Que faz uso da ação

A Bondade Superior é ação Porém não utiliza a ação A Justiça Superior é ação Que faz uso da ação A Suprema Polidez é ação que, se não obtém correspondência, repele usando o braço como reação”

(tradução pelo Mestre Wu Jyh Cherng)


Deste modo, compreendemos que o papel daquele que segue o tao é centrado na honra pelo caminho simples, pela humildade, pela aceitação, pela não-ação. Ora, estes conceitos afastam-se muito do estilo de vida ocidental, uma vez que este último assenta nos conceitos de esforço, ambição, conquista de objetivos e lógica, ignorando as raízes inatas e o fundamento interior do próprio Homem.


O Homem, seguindo o caminho ocidental, entra em choque consigo mesmo, uma vez que a sua natureza interna guerreia com as indicações de comportamento de teor social, ou seja, o seu espírito interno entrará em conflito com o seu eu fabricado. Ao estudarmos taoismo e ao se seguir o caminho e o wu wei, a vida conduzir-se-á naturalmente, sem foco nos bens materiais mas sim no nosso crescimento interno, seguindo intuitivamente o seu curso natural, isentando-nos da sensação que temos que fazer tudo pela vida, mas sim compreendendo que a vida se faz através de nós, sem pressão, sem esboços prévios e sem uma beligerante auto monitorização.


2) Estudar os exemplos da natureza. O Tao Te Ching oferece-nos um enorme conjunto de metáforas da natureza. Esta, converte-se num exemplo essencial de comportamento que deve ser acompanhado, uma vez que a natureza é isenta de regulação e não é forçada externamente.


Amplamente usados no taoismo são as metáforas da água:

a) A água move-se de forma não linear, já a nossa mente manifesta-se de forma irregular no processo, mas sendo linear em termos da sua lógica e do curso previsível que efetua;

b) A água escolhe sempre o caminho de menor resistência. Ela procurará alternativas, percorrerá maiores distâncias e não discutirá com coisa alguma ou dará importância às barreiras que o caminho lhe oferecer;

c) A água é despojada de objetivos. Ela simplesmente participa no momento da sua ocorrência e existência, ela fui e interage naturalmente com o meio;

d) A água é um exemplo perfeito de humildade. A água não entra em conflito com a gravidade por esta a obrigar a caminhar no chão. Ela não mostra desagrado ou dor;

e) A água é flexível. A água ajusta-se à forma do leito do rio, das suas pedras, não possui forma rígida e não contesta tal facto. Ela adapta-se às situações, sem trair a sua natureza;

f) A água não escolhendo e sem apresentar uma forma contundente, age gradualmente, superando os bloqueios que se lhe deparam, alcançando o seu fim.


3) A observação atenta da vida permite-nos compreender que ela atua em harmonia. Aceitando que os impulsos naturais acontecem dentro e fora de nós, perceber-se-á que esses fluem em harmonia, sincronizam-se, possuem ordem, equilíbrio e padrões que podemos reconhecer.


Esta harmonia não se trata se abdicar das nossas qualidades e feitos no sentido de podermos prosperar para um figura intelectual e complexa que tudo analisa à sua volta. Trata-se, sim, de compreender que a vida é conduzida por si mesma, ao ponto de nos consciencializarmos que cada coisa vida tem a capacidade de se auto expressar livremente, uma vez que não estamos a exigir mais que a sua própria natureza.


Quando exploramos o tao, descobrimos que o processo é a própria vida, esse macrocosmos que nos devolve a imagem de nós próprios. Com isto, apazigua-se o receio do caos e começamos a confiar no processo.


Por fim, importa contudo perceber que o tao não é uma fórmula redutível, no sentido em que, tal definição dar-nos-ia a falsa sensação que poderíamos conhecer o tao:

1) pela autoaceitação psicológica;

2) enquanto imitação da natureza;

3) uma sinergia e cooperação entre a vida à nossa volta.


Podíamos considerar que o tao é desprovido de natureza, contudo, como refere Confúcio em “Doutrina do Meio”, traduzindo: “o tao é aquilo do qual algo não se pode desviar; aquilo do qual algo se pode desviar não é o tao”. Segundo Watts, em “Tao”, traduzindo: “Esta frase (…) sugere que não há analogia entre o tao e as ideias ocidentais de Deus e da lei divina ou natural, que pode ser obedecida ou desobedecida. A afirmação é difícil, porque tanto Lao Tzu como Chuang Tzu falam de ações forçadas que estão em desacordo com o Tao. (…) Você pode imaginar que está fora ou separado do Tao e, assim, podendo segui-lo ou não; mas essa própria imaginação está dentro da corrente, uma vez que não existe outro caminho senão o caminho. De forma não planeada ou controlada, nós somos e vamos na corrente do tao. Do ponto de vista estritamente lógico, isso não significa coisa alguma e não nos dá qualquer informação. O tao é apenas um nome para o que quer que aconteça, ou, como referia Lao Tzu, “O tao, em princípio, é o que acontece de si mesmo”.


Por outras palavras, por vezes é natural sermos não naturais; por vezes é harmonioso sermos não harmoniosos; por vezes é equilibrado não sermos equilibrados; todas estas realidades fazem parte da vida.

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